A redução da mulher ao fetiche, groupie ou somente uma sex symbol no Rock N’ Roll, o lugar em que deveria se ter liberdade.
O Rock N’ Roll costuma ser entendido como um ato de liberdade, às vezes niilista, uma maneira de expor sem medo de julgamentos os sentimentos relacionados ao que exista. Mas e quando se é mulher? O que os homens fazem no palco e fora deles, também é visto com os mesmos olhos em relação às mulheres? Ou ainda há machismo? Três mulheres da cena Rock atual, contam suas experiências.
Letras de músicas famosas, como da banda Guns N’ Roses, onde a música “Used to love her” diz “Eu costumava amá-la, mas tive que matá-la” e na música “Run for your life” dos queridinhos do Rock, os Beatles, onde dizia “É melhor correr pela sua vida se puder, esconda sua cabeça na areia, garotinha, te pegar com outro homem, é o fim, garotinha” refletem o estereótipo feminino ofensivo e objetificação da mulher na música.
Ao longo do tempo, as mulheres acabam sendo mais conhecidas como groupies e reduzidas a sex symbols mesmo no ambiente do rock. Ao perguntar para alguém quantas artistas femininas conhecem, quase sempre elas são minorias, dificilmente vai ouvir mais nomes femininos do que masculinos nas playlists. Mas por que isso acontece?
No meio musical há vários exemplos de mulheres que fizeram história, como Debbie Harry, vocalista da banda Blondie, criada nos anos 70 e que continua até os dias de hoje produzindo material novo, e Joan Jett, guitarrista da antiga banda dos anos 70 só de mulheres The Runaways e vocalista solo junto os The Blackhearts, que também continua até hoje nos palcos.
Isis Queen, vocalista da banda grega Barb Wire Dolls, de punk/grunge, respondeu por e-mail à entrevista para esta reportagem e contou como se vê sendo vocalista mulher e sobre a relação com o machismo, e afirmou “ainda vejo machismo no Rock N’ Roll, sem pensar duas vezes, dizendo em porcentagem, seria 100% que ainda existe. Nada mudou desde o início, e é mais difícil ser mulher e fazer o mesmo que os homens sem ser julgada”.
Em Porto Alegre a vocalista Aline Dillenburg de 33 anos da banda Destroyers, cover da banda americana formada somente por mulheres The Runaways dos anos 70, comentou sobre o machismo na cena rock. A Destroyers é originária da primeira banda de Aline, que se chamava Washing Machine. Tinham uma parceria de produção com o Clube Silêncio, na festa chamada Rock Clube, e a ideia era a cada show, realizar um tributo diferente. Em agosto de 2013 fizeram um tributo especial a Stooges, foi o primeiro show de Aline Dillenburg, e depois a banda escolhida como tributo, foi Rolling Stones. Logo após essa parceria a banda estava feita, porém o produtor da festa e baterista da banda não permitiu que continuassem usando o mesmo nome, assim nasceu a Destroyers.
Ela conta que, inicialmente, achar integrantes para banda que sejam somente mulheres, como a original, já foi bastante desafiador, “Tem muita musicista de qualidade em Porto Alegre, mas acaba sendo que a maioria das vezes essas profissionais acabam priorizando outros estilos de som” diz a vocalista.
Ao tocar no assunto do machismo, e a relação em ser uma vocalista mulher que interpreta outra e que exige ter muita atitude, Aline disse que infelizmente o machismo isso ainda é bem forte no cenário de Porto Alegre. Contou que já aconteceu de ao chegar à portaria do evento e dizer que era da banda, o “cara” da portaria achar que é somente uma mulher que deve estar acompanhando algum homem de outra banda. “É uma viagem isso, mas eu levo na maior naturalidade e leveza, e acho até engraçado” disse Aline. Entretanto, ela disse que nunca passou por alguma situação desconfortável em show por ser mulher, que pelo contrário, que se sentia mais a vontade porque assim pode quebrar paradigmas machistas. “De modo geral, no cenário atual, sendo autoral ou cover, falta valorização da cultura, vejo que as pessoas só veem o lado do entretenimento, mas esquecem de todo o trabalho que é feito nos bastidores, toda a produção, a dedicação dos profissionais” afirmou. As pessoas acabam só querendo se divertir e aproveitar, mas não querem pagar por isso, não veem isso como um trabalho que merece reconhecimento e retorno financeiro também. E dentro disso, também tem o movimento dos músicos que dentro deste cenário acabam não se valorizando, e tocam de graça ou por um pack de cerveja. O que prejudica outros músicos que querem mudar esta realidade.
A cantora autoral Lylith Pop, de 21 anos, musicista e produtora gaúcha, com influência de New Wave, Synth Pop, Pop e Punk. Conta que antes de assumir o seu nome artístico de Lylith Pop, que é a interpretação da junção de luz e sombras, iniciou seus estudos vocais aos nove anos de idade, representou o Brasil no Concurso Internacional da Canção de Punta Del Este em 2014, e já dividiu o palco com a banda “Tequila Baby”, Supla e Lady Gaga na vinda da cantora a cidade em novembro de 2012, aos 13 anos de idade.
A respeito do machismo no meio artístico, ela diz: “Com certeza há machismo! Por mais que digam que não, ações mostram o contrário. Como ver apenas bandas formadas por homens participarem de festivais, e os únicos caras com certa influência que se aproximava, só queriam algo a mais comigo, e quando deixei claro que não, que estava ali buscando uma oportunidade de trabalho, nunca mais falaram comigo. Nos veem muito como objeto, e em Porto Alegre é extremamente forte essa “cultura” machista. É difícil, mas tem que “dar a cara a tapa” e não desistir, não ter medo.”
MUDE A SUA PLAYLIST
Não adianta cobrar reconhecimento do trabalho feminino, se não há procura pelo trabalho dessas mulheres. Não é para ser algo difícil, comece por uma revisão na sua playlist. A baixo segue uma playlist com músicas de artistas femininas, nacionais e internacionais a partir do aplicativo Spotify.